Uma publicação recente do pastor Claudio Duarte, amplamente compartilhada nas redes sociais, provocou reflexões ao afirmar que vivemos tempos de inversão de valores — nos quais o carinho, a atenção e os passeios são dedicados aos cães, enquanto filhos são deixados nas creches e pais esquecidos nos asilos. A crítica, ainda que envolta em um tom reflexivo e não acusatório, levanta uma questão sensível e complexa: quem estamos escolhendo amar com prioridade?
A comparação feita pelo autor entre o cuidado com os animais e o abandono de vínculos familiares toca em um ponto delicado da contemporaneidade — a forma como a sociedade distribui afeto, presença e responsabilidade. É verdade que há casos em que laços humanos são negligenciados, não por maldade, mas por sobrecarga, desencontros geracionais, ou mesmo por estruturas sociais e econômicas que impõem ritmos impiedosos ao cotidiano.
Entretanto, é preciso cuidado ao construir contrapontos como “atenção para quem late” versus “oração silenciosa de quem te ama”. Tal polarização pode, involuntariamente, deslegitimar o carinho legítimo que muitas pessoas sentem por seus animais de estimação — muitas vezes os únicos companheiros em um mundo marcado pela solidão e pelo distanciamento afetivo.
Não se trata de julgar quem cuida de cães, tampouco de glorificar vínculos humanos apenas por sua origem biológica. O que está em debate é a qualidade das relações: com filhos, com pais, com amigos, com animais, com a comunidade e, sobretudo, consigo mesmo. O alerta feito pelo pastor deve ser lido mais como um chamado à consciência do que como uma condenação.
É legítimo perguntar: estamos ensinando às novas gerações que o amor é escolha, tempo e prioridade — ou que ele se resume a conforto, conveniência e estética? Pais que envelhecem, crianças que crescem, e até cães que envelhecem merecem presença afetiva verdadeira, não substituída por gestos mecânicos ou ausências justificadas por rotinas apressadas.
A reflexão, portanto, é válida. Mas ela deve vir acompanhada de empatia, de compreensão pelos contextos de vida e da disposição para ampliar os laços, e não estreitá-los por comparações ou julgamentos apressados.
A pergunta final do post ecoa: O que será que estamos ensinando para a próxima geração? Talvez a resposta esteja menos em culpas e mais em exemplos — de presença, de escuta, de afeto real. Porque no fim das contas, sejam cães ou pais, filhos ou amigos, o que todos esperam é o mesmo: atenção com amor, e amor com verdade.